sexta-feira, 27 de maio de 2011

Capitulo III: Canção da criação

            Muito costumeiro é, entre os homens, culpar alguém pelos males dessa terra. Culpa-se o outro ou ao seu criador. E muitas vezes diz-se que o criador culpa ao homem. A boa nova é que não há culpa. Nem a criatura, nem seu semelhante, tão pouco seu criador são culpados.
Quando Ideia conheceu Som, uma pergunta logo de imediato lhe ocorreu; como tudo havia surgido?
- Som, meu amigo, por favor, me diga, quando você nasceu? Como e porque me fez?
Som por sua vez refletiu consigo mesmo:
- Já imaginava que esse Idéia faria muitas perguntas. E é claro que não existe problema algum em perguntar. O problema será se ele pensar ter achado a resposta.
Após pensar bastante, Som respondeu ao seu amigo e filho Ideia:
- Não sei se nasci, sei que existo. E acabei te fazendo.
- Então acho que somos parecidos – respondeu Ideia - Ambos não sabemos muita coisa, mas podemos fazer um tanto de outras.
Ao que Som acrescentou:
- Certamente somos, meu amigo. Somos semelhantes em muitas coisas.
- Mas me diga Som, como aconteceu essa sua obra? Sua criação.
- Como disse, caro Ideia, eu só sei que existo, e sei que te criei. O que posso te dizer é como me sentia quando isso aconteceu. Apenas lhe ofereço uma pequena narrativa. Quanto às suas outras duas perguntas, ainda não sei o que farei com elas.
- Por favor - Disse Ideia - Faça como desejar.
E Som começou sua exposição.
- Era um vazio completo. Não havia cor, nem matéria. Não havia luz nem mesmo escuridão. No inicio de tudo havia somente uma coisa, um Som, eu. Envolto no abismo obscuro, uma escuridão tão densa que seria possível sentir o cheiro se você tivesse muita imaginação. Eu me sentia preso, limitado, pois o infinito me parecia limitador demais. Eu estava sozinho. Olhar para aquela infinitude de escuridão fazia minha canção se perder no espaço. Tudo que eu quis naquele momento, caro Ideia, era compartilhar minha canção com alguém. Foi quando em me dividi, para meu espanto, em harmonia melodia e ritmo. Senti-me pleno, pois não estava mais sozinho, eu era três vezes eu mesmo, porém diferente, e me completava em tudo que era e fazia. Minha canção ficou infinitamente bela, pois não a fazia mais sozinho. Porém, ainda não havia com quem compartilhar. Melhor, eu acho que no fundo eu queria mais elementos para minha canção. Foi quando eu fiz tudo que você conhece. Então, Ideia, talvez seja essa a resposta de alguma de suas perguntas. Eu fiz tudo para fazermos uma grande sinfonia.
Ideia ficou maravilhado com a resposta de Som, mesmo que tenha sido mais sugestiva que absoluta. Mas de toda poesia fica algum significado, mesmo que não se entenda as palavras.
- Arriscado seu empreendimento, não é mesmo Som? – Disse Ideia – Até mesmo porque nem todos gostam de música, e nem todos, creio eu, terão talento para fazer arte.
- Quando fazemos algo por amor – respondeu Som – Dificilmente pensamos nas circunstancias.
- Percebo, diante disso – Respondeu mais uma vez Ideia – Que mais alguma coisa terá que fazer, em razão disso.
- Veremos Ideia. Veremos.

sábado, 14 de maio de 2011

Capitulo IV: Sozinho

            Frank estava sozinho no quarto. Ouvia “Exit Music” do Radiohead, álbum indicado por um grande amigo. Fazia um mês que estava na cidade, e muita coisa acontecera.
            Por algum tempo Frank achava que tudo estava dando certo, e apesar dos primeiros desesperos e da vontade de desistir, algumas vozes encorajadoras foram fundamentais para ele. E sim, Frank havia conseguido algumas coisas mesmo que ainda não o que queria.
            Havia chorado aquele mês o que não chorara desde o inicio do ano, isso porque ele só lembrava de ter chorado uma vez, no final de fevereiro.
            Frank pensou que estaria tomando uma cerveja, se ela não tivesse congelado na geladeira enquanto dormia toda tarde daquele sábado.
            Ao ouvir “Crepuscule With Nellie” de Thelonious Monk, gravado em 1954, muitos sentimentos brotaram, aquele sábado sozinho, a noite, sem cerveja, sem amigos, longe da família e sem seu jazz, apesar de estar ouvindo um. Frank estava realmente deprimido. A cidade não tinha mais o mesmo significado, e ele teria que criar outro. Mesmo que teoricamente isso não fosse um problema para ele, certamente Frank não queria ter que passar por isso.
            Frank se sentia sozinho, como alguém que é roubado, apanha e fica estirado no chão ainda molhado da chuva, sem alguém para te estender a mão e o levantar. E o bandido já fora seu amigo, uma idéia terrível o roubara a canção.
            Mas não só isso, Frank não se sentia apenas roubado. Ele sabia que ele é um problema, ele mesmo. Ele achava, agora, que se roubava toda vez que mudava de idéia. Ele pensou que talvez devesse ficar com todas elas ao invés de deixar uma para ficar com outra, mesmo que isso não fosse logicamente possível, ou aconselhável; bom, existe algo mais logicamente impossível e não aconselhável do que a vida? Frank não sabia ainda. Ser sempre foi um fardo para ele, porque no final ele sempre sabia que o problema era ele mesmo.

Mesmo sem querer


Sim!
Tenho que ir
Mesmo sem querer
Para mais uma vez
Amanhã, ver o sol nascer
Mesmo sem você
Mesmo não querendo, viver
Sim!
To indo
Talvez volte
Para mais uma vez
Dormir enquanto o sol se vai

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Solitude

Em algum lugar longe de mim
Onde quem não sou me afastou de quem me dava coragem de algo ser
Lugar longe de casa, onde não quero ser, muito menos sem você, um bom motivo
Afaste de mim o que sou
Morra em mim e ressurja algo bom
Agora de onde tirarei forças?
Como ser sem quem não é comigo?
Não é mais o que não era, e me fazia ser tão bom, melhor, mas não suficiente...
Longe de onde não vim, só encontro o erro e a velha vontade de não ser
Que desgosto esse, de viver para não ser, e não poder ser por não ser mais
Que infelicidade, que tristeza me compõe
Vontade de voltar pra casa, mas também sei que lá não tenho o que encontrar
E o que vem pela frente agora não mais me importa
Já bastava a tristeza, agora vislumbro solidão
Quem vive sem jazz e blues?

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Capitulo III: Desventuras ao nascer do sol

Era cedo. Frank acabara de sair do trabalho.
Ele andava por uma das principais avenidas da cidade, e mesmo com a normalidade deste evento, ainda não havia percebido que todo dia via o nascer do sol.
Certamente Frank refletiu sobre o como a desventura e a necessidade de fazer as coisas o distraía, impedindo-o de ver que toda desventura aventura.
Ele ouvia “Time on my hands” interpretado por Sonny Rollins com o The Modern Jazz Quartet. E não somente o nome da canção, mas toda a percepção que aqueles sons causavam em Frank geraram bastante estranhamento, Por perceber onde estava, e como ia sua vida, mas ao mesmo tempo maravilhado, pois o nascer do sol tirava totalmente o tempo de sua mão, lembrou que estava rendido ao tempo e ao acaso, e sua vontade não era nada mais do que um impulso que o inseria no jogo.

Mas na verdade, Frank queria mesmo era chegar em casa, tirar uma sonequinha, e relaxar os pés doidos pela noite de trabalho. Até mesmo porque só teria três horas e meia de sono.