segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Desventuras do sentir

Estava lá, ele, vazio. Muita gente inventa formas, coisas, que dizem preencher isso, mas saibam caros amigos, é tudo mentira! Melhor, pode ser verdade, pra você, se assim preferir, mas o caso de nosso herói era diferente, somente uma coisa poderia ajuda-lo, a saber, o amor, porém estava tão vazio que se fosse tentar dizer o que sentia criaria outra língua.          

Que rapaz teimoso, burro até. Na verdade eu tinha muita raiva dele na época em que éramos amigos, antes dele morrer, o que de fato é outra conversa. Eu dizia para ele, mas não adiantava nada, eu dizia que amar demais mata, e de fato, foi disso que ele morreu. Um dia o coração parou, ele decidiu não amar mais.   

Bom, contarei, melhor, tentarei contar, mais ou menos, é claro, pois nunca é possível contar ao certo o que se sente, imagina quando se trata do sentimento de outro, imagina nosso herói que sentia mais do que devia. Vocês podem acreditar, ele morreu de tanto sentir! E bem que eu avisei, eu dizia pra ele parar com isso! Mas não adiantava! Aquele teimoso, que vontade que dava de bater nele! Mas enfim, era meu amigo, e eu o amava, o que poderia fazer? Ele me ensinou a sentir também. E acho que morrerei da mesma coisa.           

Quando pequeno ele sobia numa arvore para sentir, olhava para o céu, olhava para baixo, para frente e para os lados, e sentia. Às vezes ele tinha vontade de pular mas como era novo não sabia o que isso significava. E quando o pé de cajá estava frutificando comer aquele azedo fruto até que parecia ter sentido. 

Eu mesmo não sei dizer ao certo quando ele começou a sentir, mas se eu esforçar muito bem a minha mente creio que me lembrarei de algo que ele me contou. Acho que sim. Era mais ou menos assim...        

Era seu aniversário de quatro anos quando ele percebeu, pela primeira vez, eu acho, aquela sensação, que nunca mais o abandonou. Ela era linda, talvez um ano mais velha, mas não importa, ele sentiu, era tudo novo. Claro que ele não sabia o que significava, mas durante toda a festa ele queria estar perto dela, e como era diferente! Nenhum de seus amigos fazia diferença, a nenhum deles ele dava tanta importância! Acho que se tivesse somente ela em seu aniversario ele não sentiria falta de mais ninguém, mas claro, isso porque ele ainda não entendia bem as coisas. Se bem que, mesmo depois de entender melhor ele ainda sentia isso. Nunca algum psicólogo conseguiu explicar.       

Uma coisa interessante sobre ele é que não gostava de sentir, ele queria mesmo parar com isso, mas não conseguia, era mais forte que ele. - Sentir dói! - Ele dizia - Como faz mal para o espírito, seja lá o que isso for.  

Não sei se isso importa, mas quando ele falava disso sempre chorava. Sempre o encontrava olhando para o céu, ou para o chão, não importa, ele sempre olhava para algum lugar, não sei o que ele via, mas via alguma coisa, não sei o que significa, mas isso mexia com ele.

Vazio Erário

De certo que o mundo deveria apagar suas velas
E se deixar iluminar pela  singela lua vazia
Para a noite que tardia chega apagada e sombria
Trazendo sono esquecimento descanso e talvez alegria
Obscurecer da memória as agonias da outrora maldita

De certo que o sol deveria se esconder fulgente e livre
Pois o amor quando brilha ofusca e até prende
Não parece mais quem é ou diz disfarça e mente
O outro se faz tanto e por completo que desejo sente
Que sofrer passa a ser sua luz e dor candente festejo

As estrelas deveriam se esconder e espaço não vos falta
Os planetas antes deuses esses por vezes esquecidos
Resolverem suas pendências com o Olimpo escondido
Para que a liberdade nos levasse de volta e não tarde
À lagrimas não mais de medo mas de esperança e surgir

O sol talvez devesse se apagar eternamente e sempre
Para não por mais fogo na floresta de seus olhos gentis
A lua não mais iluminar os raios de fogo em suas aureolas
suas cedas não mais me enfeitiçarem ao suave toque e ranhura
E seus lírios não mais me inebriarem à presença da esperança

Mas sem a vida de que de ti me tens por completo e venéreo
Do vazio que me faz o anseio de logo ver apinhado gosto
Com palavras de verdades que amargam o mais doce e seleto
Nem sol nem lua necessários são para exercer seu objeto
Pois o amor mesmo no vazio faz brilhar em mim reflexos erários

domingo, 21 de outubro de 2012

Últimos dos Sonhadores

Silencio exasperador este deixado pelo amor
Nenhuma canção mais canta o que vem ao coração
Tudo parece vulgar quando o belo escarece
E o sublime vira motivo de piadas
Uma cultura mediocre envergonha toda "areté"

Barulho atordoador este dos mudos
Que de tudo que faz e tem
Mesmo que sincero e faça bem
De tão pobre que é sua "kultur"
Sua forma ofende o escultor

Desanimadora toda aparência
Que fingida e divertida
Engana tolos e "afagãos"
Toda beleza tao falsa que é
Desanima a esperança e a razão

Essa gente que tanto agrada e quer
Desfaz toda confiança
Mas não tiram a verdade
Dos últimos que sofrem
E ainda de verdade cantam

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Porque Insisto na Esperança


            Insisto na esperança por ser ela algo novo pra mim. De fato essa palavra sempre foi tabu pra mim, como era também “felicidade”. Apesar de o texto anterior tratar sobre esses dois conceitos, quero agora dar atenção especial a esperança. E para isso tentarei ser claro e direto.     
            A teologia religiosa abortou a esperança em mim durante muito tempo. A ideia de um ser humano completamente depravado, dependente da boa vontade de um Deus cabreiro que sabe de tudo, ou pior, escolhe e determina tanto sobre essa vida agora quanto a futura, atava minhas mãos e me impedia de ver possibilidades. Pois afinal de contas, pra que ver possibilidades se o controle de tudo está nas mãos de um ser que já tem os planos determinados? Para ter esperança é necessário ter liberdade, e viver em função da suposta vontade soberana de um roteirista inquestionável não me parece liberdade, mas ser ator de uma peça chata e mal escrita, pois ninguém pode dizer que os atos estão agradando a plateia (a não ser aos conformados, que de fato, são os principais responsáveis por ser o mundo como é).     
            Quando rejeitei essa ideia de Deus um mundo novo se abriu para mim. A esperança aparece não como certeza ou a mínima crença de que o mundo ou a vida vai melhorar, mas como fruto da nossa liberdade de lutar por isso, mesmo sem garantia dos resultados. Libertar-me desse Deus assustador, que sufocava minhas perspectivas, melhor, que não me permitia ter uma concepção de vida que vá para além da minha própria salvação ou a de alguns bem aventurados que por vontade dEle ou algum milagre concordasse com determinado sistema de fé, possibilitou ver a vida como fruto de nossas escolhas, resultado de como o construímos, e de como somos culpados das coisas como são. Insisto na esperança porque fomos libertos para a liberdade, e sendo livres devemos lutar, certo de que não estaremos sozinhos, jamais.   
            Diante disso, insisto na esperança porque vim de um sistema ideológico que não permite ao ser humano se perceber como agente da sua história, e dizer “seja feita a vontade de Deus” e esse tipo de coisa, justifica o cidadão votar no candidato que supostamente está ganhando nas pesquisas, pois supostamente Deus sabe das coisas. Insisto na esperança porque posso votar no candidato que acredito ser melhor para a população, para além de meus interesses pessoais, para além das pesquisas de opinião, e para além da vontade de Deus. Insisto na esperança porque a liberdade me impõe isso!    
            Costumava acreditar que o mundo não tem solução, ou a solução era algo restrito, que não resolvia nada, e por isso havia desistido da possibilidade de tentar qualquer coisa, pois parecia inútil. Até que entendi que assim estava fazendo mau uso da liberdade, pois tomei para mim a culpa de meu pessimismo. Logo, insisto na esperança como insisto na liberdade, pois sem esperança, além de inútil, me torno escravo.        
            Insisto na esperança como insisto na vida, pois ninguém vai tirar de mim a morte. Insisto na esperança porque ninguém vai extinguir a dor e o sofrimento no mundo. Insisto, pois a tristeza é verdade, e sem esperança não há alegria. Insisto na esperança porque sem ela não é possível caminhar. Insisto na esperança porque sem ela o político corrupto sempre será eleito, e serei responsável por isso. Insisto, sim, porque sem esperança os ricos continuarão mais ricos, e os pobres continuarão deixando-os ricos. Insisto na esperança porque sei como é viver morto e sem sentido, pois crenças enlatadas e enganadoras não dão esperança, apenas amortecem e mantém o que é como é. Insisto na esperança porque ela não é só para mim, para meu amigo, para quem gosto, e sim porque ela é para o mundo, e para fora de mim, é motivo e movimento, é vida, e vida em abundancia, é virtude, é nobreza. Insisto na esperança pois ela abre meus olhos para a visão de uma amanhã, mesmo que as janelas estejam fechadas, pois sou livre para quebrar as barreias que me impedem de ver lá fora.      
            Insisto, caros amigos, na esperança, porque ninguém pode tirar de nós a liberdade. Podem nos abafar, nos amarrar, nos prender, mas nunca apagar o sol, e um dia uma fresta aparece e ele se faz conhecer.           
            Por fim, caros leitores, esperava um texto totalmente diferente do que saiu, mas para terminar, insisto na esperança porque fomos libertos para a liberdade, o libertador vive e caminha com todos, nos deu liberdade para construir, nos deu sonhos para sonhar, nos deu vontade para caminhar, não para esperar, Mas lutar! E juntos, misturados, tristes e encabrunhados, doloridos e enfadados, mas livres, construir algo novo, criar inspirados, rumo ao horizonte, utópico sim, mas visível   

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Sobre felicidade e esperança. Cultura e utopia.

              Há muito que devo um texto sobre a felicidade, assunto caro pra mim, e também sobre a esperança, assunto que ganhou lugar em meus pensamentos no ultimo ano. De certo que sou conhecido pelo pessimismo e não crença na felicidade, porém, nesses últimos três anos, em que muitas coisas resignifiquei ou mesmo passei a tentar significar, esses conceitos passaram a ser fundamentais em minha formação. A felicidade nem tanto, pois essa apenas resignifiquei para excluir de meu vocabulário. Mas a esperança, essa sim, veio com força, me trazendo vida.    
            Minha visão de felicidade mudou quando, na segunda metade de 2011, li o romance “Vida e Proezas de Aléxis Zorbás” ou “Zorba, o grego” do escritor Nikos Kazantzákis.          
            Mais ou menos no meio da história, o narrador, chamado também por Zorba de “patrão”, recebe uma carta de um antigo amigo chamado Karayiànnis, também grego, dando noticias. Para entender a história, fica a dica da leitura, vamos ao que importa que é parte do conteúdo da carta, em que Karayiànnis diz ao “patrão”:   

Percorro cidades e aldeias, reúno os gregos, faço relatórios, telegrafo, empenho-me para convencer as autoridades a nos enviarem barcos, alimentos, roupas, remédios e a conduzirem todas essas almas à Grécia. Se lutar com tanta obstinação é felicidade, então eu sou feliz.   


            Aparentemente, o romance não deixa claro, Karayiànnis era voluntario em algum lugar da Rússia, em plena guerra, e estava tentando libertar seus compatriotas gregos fazendo-os voltar para sua terra natal. A grande questão que me chamou a atenção é que felicidade para Karayiànnis é luta, é fazer algo, mas não por ele mesmo. Poderia dizer que esta luta fazia-o sentir-se pleno do ser, ou seja, a felicidade seria a realização plena de sua existência, e isso não tem a ver consigo mesmo, mas com os outros, seus compatriotas.       
            Deixando um pouco de lado a história, que você pode ler adquirindo o livro. Vou me ater ao que quero dizer. Felicidade, nesse sentido, nada tem a ver com algo bom para si, algo que de alegria, bem estar, satisfação ou realização pessoal, enfim, todo tipo de futilidade narcisista e egoísta tida no mundo do capital como alvo principal da existência. Felicidade seria a plena realização da existência, com base no principio do amor, que sugere a vida para fora, ou seja, a vida para além de si mesmo. Se considerar nesse sentido, posso alterar o termo “felicidade” por “existir plenamente” ou simplesmente “amar”. Quem pensa seriamente no amor sabe que essa é uma experiência mais “ruim” que “boa”. O amor não oferece garantia de nada, não promete resultados positivos, satisfação ou realização, amar está mais para “realizar-se para o outro”, sem garantia de retorno. Não preciso dizer que o melhor exemplo do que digo é Jesus Cristo. Logo, em resumo, todo ideal de felicidade que sugere satisfação própria, realização, alegria, contentamento etc. pode ser jogado no lixo, no esquecimento, pois é uma palavra totalmente inútil, fútil, burra.           
            Mas o que isso tem a ver com esperança? Logo vos digo!  
           Da mesma forma como felicidade não é algo bom para si, esperança não é otimismo. Acho que já escrevi aqui sobre isso, mas, esperança é tomar uso da liberdade para lutar por algo do qual não se espera sucesso. Esperança não é esperar por algo que já se sabe que vai dar certo, mas justamente o contrário, é lutar mesmo sem saber os resultados, tendo em vista, no mínimo, que ninguém sabe os resultados, pois a vida é contingente. O problema, penso eu, é que a cultura moderna, moldada pelo capital e pelo egoísmo, natural do humano mas alimentado pelo narcisismo engendrado no homem pela cultura do capital e do consumo, da realização de si mesmo, de seus interesses (outro problema), é uma cultura burra. A modernidade conseguiu construir uma cultura sem esperança, sem busca por respostas, sem vontade de luta. Uma cultura onde o que mais importa é o riso, ver uma novela idiota, um filme sem sentido, uma revista de fofoca, fazer compras inúteis, desnecessárias, enfim, uma cultura onde o que importa é satisfazer a si mesmo, chamando isso felicidade.    
            No marxismo a culpa será dada ao modelo econômico, mas considero, a partir do que alguns chamam de culturalismo, que o sucesso do modelo econômico vigente tem base na consolidação de dessa cultura burra, alienante. Logo, para mudar uma pessoa, para mudar uma sociedade, deve-se educar e construir uma nova cultura. Sobre essa cultura ideal vale outro texto, pois trato da cultura estética por meio da educação do gosto, mas deixemos isso pra depois.          
            Mesmo que tratando de forma ridiculamente reduzida, e claro, mesmo não sendo nenhuma novidade, vale dizer. O mundo fica pior à medida que as pessoas desistem da utopia, param de sonhar, se satisfazem com suas realidades medíocres e se divertem com seus entretenimentos efêmeros. Uma cultura transformadora caminha em direção a um horizonte utópico, por meio da esperança, de luta e de sonhos. Não haverá um mundo melhor enquanto a cultura for medíocre.          
            Logo, caros amigos, deixemos de buscar a felicidade burra e passemos a ter esperança, legado maior deixado por Jesus Cristo. Considero serem esses os primeiros passos para nossa reeducação e humanização, com meta à utopia, à justiça, à liberdade, e ao amor.      
            E antes de me chamar de hipócrita, pois de certo que não manifesto infimamente isso que escrevi, não se esqueça, caminhemos rumo ao horizonte utópico!